Wednesday, January 19, 2005
a noite
Amava só a noite. Amava só à noite. Disse adeus e foi ver o sol nascer. De lá longe, os raios pintaram de amarelo a terra preta. Voltou pra casa no meio das árvores. Tomou banho no rio e deitou na grama pra esperar de novo. Ela era bonita e tinha cabelos e olhos pretos. Boca vermelha e dentes brancos. Pele queimada de seca. Cor de areia de mar e couro jovem. Não enxergou nada nas nuvens. Ficou triste porque era pra vir algum recado. E não chovia.
Viu o moço menino do teatro. Achou bonito que ele tinha a cara pintada. Brincava de fazer voz e fazer careta. Pulava nas tábuas do circo ambulante. A irmã do menino chamava Rosa, mas era feia. E ele tinha uma rosa pra brincar. Mas não dava pra ninguém e não dava pra ela. Era rosa de cena, pra fazer teatro. Todo mundo vinha ver a flor do menino porque ele gritava. Fazia ela mais bonita porque a cara dele era pintada de branco. Branca de neve. E era dia.
O sol ficava grande no azul do céu aberto. O moço e a irmã faziam a cena e ela olhava como por uma janela. Mas não tinha janela. Era terra aberta e tinha os raios amarelos, sem nuvem nem sombra nem fruta ou coisa verde. O vestido dela era de cores. E nele ficavam presos pedaços de árvore e as coisas do chão, porque ela corria o dia inteiro pelo campo, na floresta e no rio.
Então o sol ia se esconder. Ia virar noite e algumas estrelas piscavam por trás do azul claro e faziam aparecer o preto de céu à noite. O moço e a irmã do teatro paravam de fazer cena dentro das madeiras. E ela ficava sozinha com o vestido de cores que sumiam naquele preto escuro. Esperava.
Ouviu o bater das asas. Sabia que era o amor. Desceu do lado dela o pássaro de ferro. Era ferro porque tinha sangue de homem feito. Sabia ela. Mais um pouco e ele perdia as penas e ganhava pernas e braços e cara de menino homem. Tinha olhos e boca pra amar ela e mãos pra agarrar ela e o vestido de cores desaparecidas.
Ficavam juntos na árvore até amanhecer o dia. Ele não falava muito porque tinha que ser passarinho, tinha que voar. Mas beijava muito e fazia muito carinho, porque era homem feito pra isso. Só ela acreditou nele, porque ela fugiu de outro amor pra tirar dele o machucado que fazia ele se perder no deserto. Passarinho não pode ficar no chão, nem no quente da areia. Tem que voar perto das estrelas pra ficar fresco. E ela fugiu pra ele.
Então era o amor dela que voava todo dia pelo céu perto do sol. E à noite aparecia pra fazer carinho e levar pra copa das árvores pra beber orvalho e dar beijo de homem com jeito de pássaro. E ela gostava de ficar nas asas dele. Flutuava no amor só dele, que era leve que nem o passarinho e bonito que nem a rosa do menino. Amava só a noite. Amava só à noite.
Viu o moço menino do teatro. Achou bonito que ele tinha a cara pintada. Brincava de fazer voz e fazer careta. Pulava nas tábuas do circo ambulante. A irmã do menino chamava Rosa, mas era feia. E ele tinha uma rosa pra brincar. Mas não dava pra ninguém e não dava pra ela. Era rosa de cena, pra fazer teatro. Todo mundo vinha ver a flor do menino porque ele gritava. Fazia ela mais bonita porque a cara dele era pintada de branco. Branca de neve. E era dia.
O sol ficava grande no azul do céu aberto. O moço e a irmã faziam a cena e ela olhava como por uma janela. Mas não tinha janela. Era terra aberta e tinha os raios amarelos, sem nuvem nem sombra nem fruta ou coisa verde. O vestido dela era de cores. E nele ficavam presos pedaços de árvore e as coisas do chão, porque ela corria o dia inteiro pelo campo, na floresta e no rio.
Então o sol ia se esconder. Ia virar noite e algumas estrelas piscavam por trás do azul claro e faziam aparecer o preto de céu à noite. O moço e a irmã do teatro paravam de fazer cena dentro das madeiras. E ela ficava sozinha com o vestido de cores que sumiam naquele preto escuro. Esperava.
Ouviu o bater das asas. Sabia que era o amor. Desceu do lado dela o pássaro de ferro. Era ferro porque tinha sangue de homem feito. Sabia ela. Mais um pouco e ele perdia as penas e ganhava pernas e braços e cara de menino homem. Tinha olhos e boca pra amar ela e mãos pra agarrar ela e o vestido de cores desaparecidas.
Ficavam juntos na árvore até amanhecer o dia. Ele não falava muito porque tinha que ser passarinho, tinha que voar. Mas beijava muito e fazia muito carinho, porque era homem feito pra isso. Só ela acreditou nele, porque ela fugiu de outro amor pra tirar dele o machucado que fazia ele se perder no deserto. Passarinho não pode ficar no chão, nem no quente da areia. Tem que voar perto das estrelas pra ficar fresco. E ela fugiu pra ele.
Então era o amor dela que voava todo dia pelo céu perto do sol. E à noite aparecia pra fazer carinho e levar pra copa das árvores pra beber orvalho e dar beijo de homem com jeito de pássaro. E ela gostava de ficar nas asas dele. Flutuava no amor só dele, que era leve que nem o passarinho e bonito que nem a rosa do menino. Amava só a noite. Amava só à noite.